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Paulo Machado: “Na Índia podemos vir a ter milhões de infetados”

Liga Portugal | 30/03/2020
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Não sentiu a pandemia na Índia, devido ao formato do campeonato, que ainda assim terminou no dia 14 deste mês, mas acha que, uma vez chegando aquele país, o Covid-19, pode ter um efeito devastador. O Mumbai City não participou no play-off por ter ficado na quinta posição (são os quatro primeiros classificados que disputam a derradeira fase do campeonato), e isso levou a que Paulo Machado tenha regressado a Portugal em janeiro, muito antes de se ouvir falar do vírus. O médio internacional português não veio sozinho, pois Jorge Costa, ex-colega e agora treinador do emblema indiano, fez-lhe companhia no avião.

Paulo Machado já passou por vários clubes na sua carreira. Jogou no FC Porto, no qual fez toda a formação, no Dínamo de Zagreb (Croácia), no Toulouse (França) e Olympiakos (Grécia), antes de voltar ao futebol português com a camisola do CD Aves. O médio, de 33 anos, confessa que ficou surpreendido com as condições que lhe são dadas no Mumbai City. “Sou tratado até bem demais”, afirma com alguma dose de humor.

 

Como está a viver a situação do COVID-19? Como sente que está a Índia e as pessoas a viverem esta fase?

Agora estão a começar a dizer às pessoas para ficarem em casa e não saírem, de todo. Mas em termos de higiene, eu estive lá e sei, tem sítios onde há higiene, mas outros em que não há higiene nenhuma. Na maioria dos sítios, nas ruas, não há higiene absolutamente nenhuma. Deus queira que não, mas o vírus chegando lá, acredito que poderemos estar perante um cenário com milhões de infetados. A Índia não vai ser como falam aqui na Europa, acredito que poderá ser ainda pior.

Mesmo tendo o campeonato terminado tarde a meio deste mês, acha que agora na Índia as pessoas estão finalmente conscientes da gravidade da situação?

Pelo país em si, bem… Eles têm festas quase todas as semanas. Com as várias religiões, eles têm uma festa por semana. Acho que, não sei se é neste mês ou no próximo, eles têm uma das maiores festas da cidade, na qual estariam normalmente umas cinco ou sete mil pessoas. Mesmo que eles estejam conscientes, aquilo é um país com muita população, não tem grande higiene, porque há muita gente a viver na rua. Só a cidade onde eu estou, Mumbai, tem 22 milhões de habitantes, mas só os que estão registados. Na prática, diz-se que vai até aos 30 milhões de habitantes, só naquela cidade. Se aquilo calha mesmo de alastrar ali, vai ser um país diferente de todos os outros, vai morrer ali gente que nunca mais acaba...

Posto esse cenário absolutamente catastrófico, pondera voltar a jogar na Índia?

Primeiro tenho de ver o que é que vai acontecer… Mesmo antes de ir para a índia, ninguém falava disto e já lá existiam grandes doenças, no entanto eu fui para lá e não tive problemas nenhuns. O clube proporcionou-nos um sítio muito bom e com grandes condições, por isso não tenho razão de queixa. Claro que agora com a pandemia, uma pessoa pondera sempre… Nem é por mim, é pela minha família.

O que tem feito ao nível de cuidados/recomendações?

Lavo muitas vezes as mãos e ponho as crianças sempre a lavar as mãos também, com álcool, sempre com muita higiene. Se eu for à rua ou tiver de ir buscar alguma coisa, quando chegar temos à entrada uma caixa para deixar a roupa com que fomos à rua. Se for preciso sair outra vez, veste-se a mesma roupa. A preocupação é não infetar ninguém na família.

Como foi a adaptação ao futebol indiano? Algumas particularidades que ache relevante referir?

Nem é só o futebol em si, mas a maneira como nos recebem no país, no clube, a maneira como tratam os estrangeiros… Já estive em muitos clubes, mas nunca fui tratado tão bem como na Índia. Tratam-me muito bem. Quer dizer, não é tratar bem, é muito bem… até bem demais. São muito atenciosos. É incrível.

Como é ser treinado pelo Jorge Costa depois de terem sido companheiros de equipa no FC Porto?

Espetacular. Já tinha trabalhado com o mister como jogador e calhou de ele me levar para trabalhar com ele no Mumbai City. Não foi estranho, já se sabe que isto é trabalho, mas temos a amizade e respeitamo-nos mutuamente. Ele sabe que eu sou o jogador, eu sei que ele é o chefe, o treinador... Lidei bem com isso. Há que saber separar o futebol da amizade. Quando é para trabalhar, é para trabalhar, quando é a amizade, é a amizade.

Que conselhos se dão nesta altura a um adepto de futebol, que está sem futebol, porque tem de ser?

Têm sido transmitidos jogos antigos na televisão, tem sido agradável. Mas para quem ama o futebol, não é fácil viver sem o futebol. Se para o jogador é difícil, imagino para os adeptos, que têm a rotina de todas as semanas verem o seu clube jogar. Não é fácil, eu sei, mas estamos a falar da vida humana.  É preciso ter essa noção. Pensar na família e proteger a família. O futebol vai voltar, mas neste momento, o mais importante é a vida humana.

Como tem ocupado o seu tempo em casa? Tem sugestões para os adeptos?

A minha ocupação, pelo menos a minha e a da minha mulher, é ajudar os nossos filhos com os trabalhos de casa. Temos ajudado naquilo que podemos. Depois, temos de ter alguma atividade. Mesmo a casa sendo pequena, tem de se arranjar forma de ver um filme, jogar Monopólio, entre outras coisas. Procuramos variar para tornar as coisas mais divertidas e não nos aborrecermos. A monotonia torna-se cansativa por vezes. Não é fácil para os adultos, pois há crianças que são mais ativas e que não conseguem estar paradas. Temos de arranjar alguma coisa para eles fazerem, senão vão acabar por ficar chato (risos).